17 setembro, 2002

Bêbado

Deovaldo chegou bêbado novamente, como fazia todas as noites, porém, via-se que desta vez exagerara. Estava com aqueles ares de bêbado inoportuno, daqueles que fica horas com o cigarro na boca, apagado, de um lado pro outro, pede isqueiro emprestado, coloca no bolso e esquece. Vinha cambaleando pelas ruas, quase em ziguezague. Encontrou uma casa parecida com a sua, entrou.
- Ô de casa! - Gritou do portão. As luzes acenderam.
- Mas quê...? - uma voz sonolenta quase perguntou o que se passava. Deovaldo emendou:
- Boa noite, senhora, pode dizer-me se moro aqui?
- Quê?
- Pode dizer-me se moro aqui, senhora? Estou com pressa e a minha mulher está me esperando. Você é minha mulher?
- Senhora é o raio que o parta! Isso são horas de acordar os outros?
- Olhe a minha cara, senhora, veja se sou seu marido. Preciso ir logo.
- Não sou mulher, sou homem! É óbvio que você não é meu marido. Vá andando, rapaz. vá... vá... Antes que te dê um murro!
Os cachorros da rua toda latiram neste momento, os vizinhos acordaram para ver o que se passava, uma boa quantidade de curiosos já estava em seus respectivos portões, vestindo pijamas e camisolas coloridos. Deovaldo insistia:
- O que você está fazendo na minha casa?
- Esta casa é minha! Nunca te vi mais gordo! vá andando...
O homem começava a perder a paciência, as bochechas avermelhadas já denunciavam o estado de fúria de quem fora acordado às três da manhã por um bêbado perdido.
- Poderia então chamar minha mulher? Mariaaaaaaaaa!!
- Vou buscar a garrucha!
- Que Garrucha? O nome dela é Maria!
O povo acompanhava o caso curioso, uns torcendo para o bêbado, outros queriam a garrucha piando na noite. Deovaldo fez menção de entrar, o homem correu dentro da casa e voltou armado:
- Sai pra lá que eu atiro!
- Que isso, Maria? Não cheguei tão tarde assim... Dê cá um beijo...
- Sai pra lá que vai chumbo!
Os cachorros latiam.
O povo fazia torcida.
O homem já se preparava para atirar no bebum, Deovaldo pedia a bicota, havia tensão na rua toda que se preparava para presenciar a consumação do causo: atira ou não atira? O homem suava, e Deovaldo na mira...
- Deovaaaaaaaaaaldoooo! - Uma voz de mulher cruzara a esquina chamando o sujeito, este se virou, reconhecendo a esposa.
- Mas quê...? - O homem quase perguntou. Desfez a mira, por pouco não atirou. Suava ainda.
- Ah, seu malandro! Na casa da outra, não é?
- Maria, de onde você saiu? - Perguntou Deovaldo olhando para a esposa que lhe aplicava tabefes.
- Vamos pra casa, vagabundo! Isso são horas?
A torcida foi-se desfazendo aos poucos, alguns ainda ficaram comentando o caso até amanhecer o dia, trouxeram bebida, outros foram dormir. O homem bebeu com os vizinhos, guardou a garrucha - quase matei o sujeito - dizia.
Maria levou o marido pra casa, depois de boa sova e falatório, foram dormir. Lá pelas cinco da manhã acordaram. Um bêbado no portão de sua casa gritava:
- Ô de casa!

Vander Claudio

Nenhum comentário: