21 junho, 2002

Valeu Drummond , descanse em paz ..


Morre em BH o escritor e cronista Roberto Drummond

Gerais



(Redação Uai)

Morreu na madrugada desta sexta-feira, em Belo Horizonte, aos 68 anos, em decorrência de um infarto, o escritor e cronista mineiro Roberto Drummond. Seu maior sucesso, "Hilda Furacão", lançado em 1991, transformou-se em seriado na Rede Gobo em 98 e foi traduzido em vários idiomas. Em setembro do ano passado, Roberto Drummond publicou o seu último romance, "O Cheiro de Deus", também sucesso de vendas em todo o Brasil. Em 2001, o cronista voltou ao jornal ESTADO DE MINAS e passou a escrever colunas diárias nos cadernos Esportes e EM Cultura.

Roberto Drummond foi repórter dos jornais Última Hora e Binômio. Atleticano símbolo, ficou marcado pela frase "Se houver uma camisa preta e branca pendurada num varal durante uma tempestade, o atleticano torce contra o vento". Realizou o que se pode chamar de literatura pop, com elementos de surrealismo, humor e protesto: "Ele te falará da solidão do poder. A solidão de um ditador. (...) Ah, não, tu não sabes, tchê, como é a solidão do poder".

Mineiro de Ferros, no Vale do Rio Doce, Roberto Drummond iniciou a carreira em 75, quando recebeu o Prêmio Jabutí como escritor revelação com a obra "A Morte de DJ em Paris". Dalí em diante, teve nove livros publicados: "Ontem à noite era sexta-feira", "Inês é morta", "Sangue de Cola-Cola", "O dia em que Ernest Hemingway morreu crucificado", "Quando fui morto em Cuba", "Hitler manda lembranças", O homem que subornou a morte", "Hilda Furacão" e ".O Cheiro de Deus".

Na tarde de quinta-feira, após escrever a coluna "Seja o que Deus quiser" para o caderno de Esportes do jornal ESTADO DE MINAS, referente à partida entre Brasil e Inglaterra pelas quartas-de-final da Copa do Mundo, Roberto Drummond se queixou de uma forte gripe com os colegas de redação. Na madrugada desta sexta, ele sofreu um infarto fulminante.

O velório será realizado a partir das 8 horas desta sexta na capela 2 do cemitério do Bonfim, na capital mineira. O sepultamento está marcado inicialmente para às 17 horas.

Última Crônica

Roberto Drummond - Seja o que Deus quiser
Escrevo esta crônica 12 horas antes do jogo Brasil x Inglaterra. Vocês sabem: sou fascinado com bolas de cristal, videntes, tudo que pode prever o dia de amanhã, o futuro e seus mistérios, o que está por acontecer. Mais do que nunca, gostaria de ter uma bola de cristal ou os poderes de vidente de minha amiga madame Janete, só para saber quem venceu, se a Seleção de Ronaldinho, se a seleção de Beckham.

Poucas vezes desejei que o Brasil vencesse como agora. É verdade, a gente sempre quer que o Brasil vença. É uma vontade, um sonho, que está no coração de mais de 170 milhões de brasileiros. E não é para menos. Nosso país tem uma porção de esperanças, mas a vitória no futebol alegra o coração brasileiro, faz subir a nossa auto-estima, tão castigada, tão arranhada. E nos permite uma festa de irmãos e de irmãs, já que a Seleção Brasileira nos une acima das ideologias, dos partidos políticos e, num ano eleitoral como este de 2002, acima dos candidatos a presidente da República.

Nenhum estadista brasileiro, nem mesmo os dois maiores, Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek de Oliveira, deram à nossa alma carente as alegrias que Pelé e Garrincha, Didi e Nilton Santos, Tostão, Gérson, Rivelino, e Jairzinho e ainda Taffarell , Romário e Bebeto nos deram. Em outros tempos, as esquerdas brasileiras diziam que o futebol era o ópio do povo.

Essa opinião foi particularmente forte nos idos de 1970, quando a Seleção Brasileira ganhou o tri no México. O Brasil vivia os anos de chumbo. Era a noite da ditadura militar, iniciada com o golpe militar de 1964. O general Médici era o presidente da República e soube usar a conquista da Seleção Brasileira para dizer que o Brasil dava certo. Até parecia que os gols de Pelé, de Tostão, de Gérson e de Jairzinho, sem esquecer Rivelino, Carlos Alberto e Clodoaldo, tinham sido feitos pelos militares.

Nessa época, as esquerdas, que sofriam violentamente com a ditadura e perderam muitos de seus quadros torturados, assassinados, banidos, acreditavam que a conquista do tri prestou um benefício enorme aos generais. Hoje, passado tanto tempo, eu pergunto: será que foi assim mesmo? Lembro-me de minha própria divisão no dia em que o Brasil ganhou o tri. Eu já era cronista de futebol do ESTADO DE MINAS, na época da rua Goiás. Metade de mim cantava e festejava, metade de mim chorava, porque eu também acreditava que o feito da Seleção Brasileira ia ajudar a ditadura militar.

Ajudou ou não ajudou?

Ajudou, pois era o tempo do chamado milagre brasileiro e a euforia das ruas contava ponto a favor do clima de ufanismo que a ditadura militar queria criar. Muita gente diz que o penta vai ajudar o governo FHC e, portanto, a seu candidato a presidente da República, José Serra, e atrapalhar a candidatura de Lula, o líder nas pesquisas. Eu penso que não. Hoje vivemos numa democracia e o povo brasileiro vai votar, não por causa do penta, mas segundo uma avaliação consciente.

Acabei me desviando do que estava escrevendo. Eu dizia que poucas vezes eu quis com tanto fervor que a Seleção Brasileira derrotasse um adversário, no caso, a Inglaterra. E olhem que a Inglaterra, que para mim é a pátria de Shakespeare e de Dickens, dos Beatles e dos Rolling Stones, sem esquecer que é o berço do Partido Trabalhista, é um país de minha simpatia. Os ingleses inventaram o futebol e esse detalhe também conta ponto a favor. E os ingleses (como narro em meu livro O Cheiro de Deus) moraram em Belo Horizonte e exerceram uma grande influência em nossos costumes, como o culto aos fantasmas e deixaram uma palavra na maneira mineira de falar, o nosso uai , o porquê deles.

Mas futebol é futebol e eu estou, como cronista, particularmente engajado com a Seleção Brasileira, principalmente por causa de Ronaldinho, em cuja recuperação apostei. Contam os outros jogadores também, incluindo, claro, Gilberto Silva e Edílson. E eu sou brasileiro. Ainda: Inglaterra é um adversário forte demais e vencer (ter vencido) o time de Beckham, é carimbar o passaporte para o penta.

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